domingo, 3 de outubro de 2010

Ponto

Se existe um momento da vida em que ela vira um furacão e te põe no olho, eu estou num desse. E o olho não é exatamente o momento do completo desespero, em que você apenas faz um monte de merda, sabe que está fazendo, mas não pode responder porquê, onde errou e, muitíssimo menos, como poderia ter evitado. Uma vez no olho, você já avançou de fase e consegue saber que tipo de estímulo gera a merda, quais os estopins, como seu padrão dirá para reagir e, uma vez semi-consciente, sabe que é preciso pisar no freio pra não aumentar o problema.
É quando você se choca consigo mesmo e já tem uma idéia do tipo de monstro que é. Claro, porque todos somos, mas mostramos isso em cenas diferentes. E é preciso matar partes dele pra manter outras relações vivendo sadiamente.
Eu recentemente fui me pondo em frente a mim mesma, me envergonhando de mim mesma, e tentando transformar isso em azeite extra virgem. Sim, pegar o óleo preto e purificar. Purificar o poder de se perdoar sem auto-piedade. Entender que o monstro muitos ajudaram a formar, mas só você pode consertar, afinal, você consentiu por várias vezes pra que ele chegasse aqui tão fortalecido.

Estou aprendendo que perdoar alguém só é possível quando você já aprendeu a se perdoar por ser quem é. E quando aprendeu a não se conformar em ser ruim nem se engrandecer por ser bom, e principalmente não ser indiferente às conclusões que tira sobre si mesmo.

Eu não consigo mais fazer das palavras um ponto final na construção do meu crescimento. Já consegui e espero voltar a conseguir. Mas nem de longe isso me deixa amortecida. Acho que os pontos agora estão sendo colocados lá fora, na vida real.

Vivamos.
“Sou o que se chama de pessoa impulsiva. Como descrever? Acho que assim: vem-me uma idéia ou um sentimento e eu, em vez de refletir sobre o que me veio, ajo quase que imediatamente. O resultado tem sido meio a meio: às vezes acontece que agi sob uma intuição dessas que não falham, às vezes erro completamente, o que prova que não se tratava de intuição, mas de simples infantilidade.
Trata-se de saber se devo prosseguir nos meus impulsos. E até que ponto posso controlá-los. [...] Deverei continuar a acertar e a errar, aceitando os resultados resignadamente? Ou devo lutar e tornar-me uma pessoa mais adulta? E também tenho medo de tornar-me adulta demais: eu perderia um dos prazeres do que é um jogo infantil, do que tantas vezes é uma alegria pura. Vou pensar no assunto. E certamente o resultado ainda virá sob a forma de um impulso. Não sou madura bastante ainda. Ou nunca serei.”

Clarice Lispector